LOCUTOR DE SANGUE AZUL
"O fruto de cada palavra retorna a
quem a pronunciou."
(Abu
Shakur, Poeta Persa do Século X)
.......
O recente falecimento do radialista João Luiz
Barão, em 20 de janeiro de 2.013, o
inscreve no memorial dos grande nomes da radiofonia brasileira. Tenho convicção
disso pois sei que não é preciso se estar em grandes empresas de radiodifusão
para se ser grande. E o Barão, como era conhecido, era grandioso pela energia
que dedicava a seu trabalho, a cada sábado, na Rádio Nativa FM.
Eu estudava Direito em Pelotas e vinha, aos
fins-de-semana, para a casa de meus pais na Costa do Barrocão, isso quando
ainda não havia energia elétrica. Em um rádio a pilha, escutávamos a recém
inaugurada Rádio Nativa FM, uma novidade para os piratinienses pois nosso
município ganhava seu primeiro veículo de comunicação sonora.
E foi num sábado de verão, após saborear vinho
artesanal no almoço com minha família,
que, ao me recostar para a tradicional sesta, fiquei positivamente
surpreendido com aquela voz aveludada e de dicção perfeita que chegava em nosso
lar pelas ondas do rádio portátil de meu irmão. Não era somente a forma (timbre
e correta pronúncia das palavras) mas o conteúdo do que aquele locutor
veiculava, desde a mensagem que abria o programa, com uso de figuras de
linguagem, as piadas convenientemente escolhidas para um público diversificado
de crianças, jovens e adultos, as informações surpreendentes sobre temas gerais
e o poema de fechamento acompanhado de um sucinto “tchau”.
Alguém me disse, há muito, muito tempo: “rádio
não é vitrola”, ou seja, é muito fácil o locutor ficar somente rodando músicas,
é necessário se oferecer mais aos ouvintes. E isso, Barão fazia com maestria.
Fui seu colega de emissora por vários anos, e
mantínhamos uma relação muito amistosa, com liberdade bastante para nos imitarmos,
mutuamente. Eu o apelidei de “locutor de sangue azul”, uma alusão ao título
nobre (barão) do seu sobrenome. Ele, ao microfone, brincava com meu sotaque ao
dizer “dobre v, dobre v, dobre v” ao invés de “w” (dáblio). Ele me escutava
quando eu apresentava de segunda-feira à sexta-feira, o Raízes da Terra 1ª
Edição, dediquei-lhe muitos causos e músicas, oportunamente em que convidava os
ouvintes para “escutarsh” (Barão tinha a fineza de chiar os últimos erres) o
seu Sábado Especial. Aquilo tudo era
muito saudável entre nós.
Por várias vezes, perguntava-lhe e ele me
contava com detalhes sobre os tempos difíceis de sua profissão em rádio e
televisão quando os censores (agentes do governo federal) vistoriavam todos
os textos antes de serem emitidos pelas
emissoras. Com o fim da censura, Barão continuou na mesma preocupação de
escolher as palavras certas a serem ditas e as músicas para fundo delas.
A epígrafe deste texto não foi escolhida por
acaso: João Luiz Barão, onde estiver, está a colher os doces frutos das
inúmeras palavras benfazejas que nos disse pelo rádio.
JUAREZ MACHADO DE FARIAS
Advogado. Radialista.
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