segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Ele matou e foi chorar no velório

Luiz Carlos( Camisa azul) foi e chorou no velório

O banco de madeira simples, posicionado sob uma árvore de tronco vasto em frente à casa de número 231 da rua Tijucas, não servirá mais para o descanso da dona de casa Carmem Cunha Flores, a Carminha, 69 anos, nos fins de tarde da calorosa Armação, em Penha, no Litoral Norte. 




A residência dos Flores, a poucos quilômetros do Parque Beto Carrero World, ganhou ares de horror ao abrigar os assassinatos brutais de quatro pessoas da famíliana noite de sexta-feira: Carminha, o marido Luiz Nilo Flores, 72, o Tio Lica; a filha Leopoldina, 41, conhecida como Preta; e o neto Pedro Henrique, um menino sorridente de dez anos.



Na tarde de domingo, a Polícia Civil confirmou aquilo que os moradores já desconfiavam, ainda que com incredulidade: Luiz Carlos Flores, 38, um dos dez filhos do casal e irmão de Preta, confessou ter matado os quatro a marteladas, depois de ter consumido cocaína. 



Detido para depoimento logo após afirmar estar tomando banho enquanto a família era assassinada, e liberado em seguida, Luiz Carlos participou do disputado velório, no sábado. Liquinha, como é conhecido, manteve-se de cabeça baixa e olhar fixo, um tanto isolado de parentes e amigos. Ajudou a carregar o caixão de Preta, cuja rivalidade motivou a série de crimes, apurou a polícia.



Em um bairro onde todos se conhecem, nem que seja por apelido, muitos moradores sabiam de detalhes da história porque a acompanharam quase ao mesmo tempo que a polícia. Passava das 22 horas de sexta quando clientes do bar de um dos filhos de dona Carmem, do outro lado da estreita Tijucas, ouviram gritos estarrecedores vindos do terreno da família. 



A poucos metros, Evaldo de Melo, 41 anos, primo do casal de idosos, havia retornado de uma revelação de amigo secreto cerca de 20 minutos antes, e estava na varanda de casa. A voz carregada de horror foi revelada tão logo Liquinha ganhou a rua com as mãos na cabeça. 



Segundo um dos homens que estavam no boteco, que preferiu não se identificar, Luiz Carlos estava ofegante e não parava de dizer que haviam matado o seu pai, a sua irmã e o sobrinho, e que sua mãe estava desaparecida.



O homem foi à casa dos Flores – o primeiro a entrar – e se deparou com os corpos de Tio Lica, Preta e Pedro Henrique, que dormia em sua cama. Instantes depois, a cena chocaria também uma vizinha que foi à casa e o outro filho do casal, que dormia na casa nos fundos do bar.



Após um dia de pesca na Praia Vermelha, Roberto Luiz Flores, 50, filho do casal de idosos, chegou em casa perto das 20 horas, ávido por um banho. Estava cortando um pão quando, por volta das 21h15, foi surpreendido pelo filho que estava na casa dos avós brincando com Pedro Henrique. 



— Não vai dormir na casa da vó hoje? —, perguntou. 



— Hoje não —, disse o menino, que o ajudou a cortar o pão. 



Horas depois, o pescador se pegaria imaginando como a escolha do garoto pode ter sido decisiva para que a tragédia não fosse ainda maior.



Roberto adormeceu e acordou quase uma hora depois com as vozes da multidão que havia tomado a rua. As batidas na janela do quarto lhe roubaram o pensamento e ele se deparou com um amigo. 



— Tenho uma notícia para te dar que não é muito boa. Mataram o teu pai, a tua irmã e o teu sobrinho, e a tua mãe tá desaparecida —, disse o homem, com voz tremida. Transtornado, o pescador atravessou a Tijucas em meio à multidão.



No quarto dos pais, viu o corpo de seu Luiz caído ao lado da cama. Encontrou o corpo de Preta atrás da porta do quarto dela. O sobrinho estava sobre a cama, no quarto dele. Ao lado do menino, a cadela da família encarou o pescador silenciosamente.



Não demoraria para que o corpo de Carmem fosse encontrado por outro filho cerca de 100 metros quintal adentro, perto de uma vala, com as mesmas marcas na cabeça que o restante da família.



A 70 km de Penha, em Joinville, o pai de Pedro Henrique, Moisés Antônio Flores, era acordado, por volta da meia-noite, por um telefonema da irmã. 



— Meu primo estava na pizzaria ali perto (em Penha) e alguém contou para ele, que ligou para a minha irmã. Ela me contou que tinham matado o meu filho, o avô e a avó. Vim com a minha mulher —, contou, parecendo ainda não acreditar no que dizia.



Motivações foram ciúme e não deixar testemunhas

Das 13 às 15 horas de domingo, em Balneário Piçarras, uma conversa entre investigador e suspeito solucionou a chacina para a Polícia Civil. Foi quando Luiz Carlos Flores confessou ter matado os pais, a irmã e o sobrinho. O martelo e a marreta pertenciam à família.



Indícios na casa aliados a contradições do primeiro depoimento de Luiz Carlos e a desconfianças de parentes completaram o quebra-cabeça, disse o delegado Rodolfo Farah Valente Filho, que cumpre plantão aos fins de semana em Penha.



Aparentemente, diz o delegado, as mortes não foram premeditadas. Luiz Carlos é usuário de cocaína e estaria sob efeito da droga. Ele contou que pretendia matar a irmã, que considerava explorar os pais e ser superprotegida por eles. Depois, decidiu matar a mãe para que ela não sofresse. Ele chamou Carmem ao quintal, onde a golpeou com a marreta. Entrou na casa e atingiu a irmã com um martelo. Matou o sobrinho e o pai para não haver testemunhas.



Luiz Carlos está em local não divulgado pela polícia para não ser linchado. Um mandado de prisão temporária deve ser expedido pela Justiça nesta segunda ou terça. Horas antes da confissão, Liquinha estava sentado atrás do caixão que abrigava o corpo da irmã, no velório. Apesar das suspeitas confessadas por familiares, parentes e amigos escolheram chorar a dor em vez de hostilizá-lo.

Zero Hora
* Colaborou Victor Pereira

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